Na vida de solteiro, liberdade é fazer o que se quer. Na vida de casado, liberdade é honrar a confiança: oferecer atenção e corresponder simultaneamente com a atenção recebida.
Há regras a serem seguidas, estabelecidas pelos dois. O ciúme ou a perda de credibilidade virá à medida em que elas são quebradas. Não percebemos de que o amor é legislação, e temos que respeitar o acordo e prestar contas da rotina. Não adianta bancar o esperto ou o distraído. Corrupção amorosa é desrespeito.
Solteiro pode bater a porta de casa sem avisar, aparecer na manhã seguinte sem explicar coisa alguma, dormir fora sem medo do despejo, voltar bêbado derrubando móveis e mijando no vaso da sala.
Casado tem alguém que se importa com todos os seus movimentos. Pois ternura é valorizar os mínimos detalhes, olhar para o hipotético com singularidade.
A emoção domina os fatos. Não existem bobagens quando predomina a compreensão e o hábito de se colocar no lugar do outro.
Se você sai sozinho, o seu papel é não deixar a sua companhia preocupada. Não tem como abandonar a relação nem por um momento. Não custa mandar mensagens dizendo como está e o que vem fazendo. Uma foto ou um comentário não corresponderá tempo perdido ao longo de uma festa ou de um jantar. Serão apenas alguns minutos de seu prazer. É um investimento irrisório para garantir a felicidade do casal e não gerar questionamentos à toa. Muitos não realizam porque não pretendem sentirem-se controlados. Alegam que não acessaram o celular, de que estava no silencioso ou de que a noite passou rapidamente. E quem até o momento esperava na boa, confortado, impregnado de fé, respeitando o espaço de cada um, ficará pensando bobagem (mais envolvendo a insegurança de hoje do que a infidelidade).
Sua alegria não deve tirar o sono de ninguém, não deve roubar o sossego de ninguém. Não é consolo explicar que não fez nada de errado e não traiu, que sempre impede o pedido de desculpa. Não é este o problema que estará em questão, mas a completa indiferença. Aquele que reclama termina com a fama de possessivo. E o que não avisou chama para si o papel de vítima, já que aparentemente não cometeu nenhum grande erro.
O relacionamento é feito de pequenas reciprocidades. O risco é confundir cuidado com vigilância. Nos dias atuais, com as notícias policias prosperando, não é possível contar com o luxo de desaparecer por cinco horas.
Casar tem o lado ruim de não ser mais inconsequente.
O nome disso é responsabilidade. Não há lealdade excluindo a responsabilidade.
Publicado no jornal Zero Hora
Revista Donna, p.56
Porto Alegre (RS), 20/12/2015 Edição N°18391
Revista Donna, p.56
Porto Alegre (RS), 20/12/2015 Edição N°18391