sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Regressão a Vidas Passadas











Entrevista a Brian Weiss, o psiquiatra que defende a eficácia da terapia de regressão a vidas passadas
O que leva um reputado psiquiatra a arriscar o seu futuro profissional? Uma descoberta. Catherine sofria de ataques de pânico, fobias e pesadelos e era acompanhada por Brian Weiss há um ano. Sem sucesso.

O então director do serviço de Psiquiatria do Mount Sinai Hospital decidiu recorrer à hipnose e, graças a esta técnica, a paciente viria a conseguir recordar memórias infantis traumáticas. Mas não só: o médico conta que, quando lhe pediu para regredir até a origem da sua dor, Catherine, ao longo de várias sessões, descreveu-lhe detalhadamente vidas passadas. Os sintomas foram desaparecendo.

Este caso ocorreu há mais de 20 anos. Desde então, Brian Weiss foi criticado e aplaudido. Escreveu inúmeros livros sobre a terapia de regressão a vidas passadas, deu palestras por todo o mundo e dezenas de entrevistas, entre as quais a Oprah Winfrey. Numa das suas mais recentes visitas a Portugal, conversámos com ele.

Em 2008, Oprah Winfrey dedicou um programa ao seu trabalho, no qual o famoso Dr. Oz se submeteu a uma sessão de regressão. Como foi essa experiência?

Era suposto ser um só programa sobre fobias mas acabaram por ser dois, porque havia muitos pacientes no estúdio. O Dr. Oz não tinha nenhuma fobia, apenas quis experimentar. Foi incrível. É um ser humano muito espiritual, assim como Oprah. Há uns anos, era mais inibida em relação a estes temas, mas tem-se tornado um modelo na divulgação de conceitos ligados à espiritualidade e de nomes como o de Eckhart Tolle.



Assume que, há cerca de duas décadas, quando escreveu o seu primeiro livro, teve receio da reacção dos seus colegas. Como é que se libertou desse medo?

A certa altura, senti que era a atitude certa. Só comecei a escrever «Muitas Vidas, Muitos Mestres» três ou quatro anos depois de ter conhecido Catherine devido ao receio que tinha de que isso afectasse a minha reputação. Houve uma reacção negativa por parte da comunidade médica. Alguns psiquiatras apoiaram-me, outros quiseram que a minha licença fosse revogada. Não funcionou. Tinham-se esquecido do que é a ciência na sua essência: ter uma mente aberta para podermos aprender coisas novas.
Explique-nos as diferenças e ligações entre hipnose, regressão e regressão a vidas passadas.

A hipnose é uma técnica que consiste em relaxar o corpo enquanto a mente está focada. É um estado de concentração descontraído em que a memória está mais activa. Todos os dias somos hipnotizados: quando vemos um filme e não ouvimos a pessoa ao lado a comer pipocas; quando estamos a conduzir e a nossa mente vagueia; quando lemos um livro e não ouvimos o trânsito.

Existem ainda equívocos em torno da hipnose?


Há ideia de que podemos ficar «presos» a esse estado. Isso seria como ir ver «O Gladiador» ao cinema e ficar «preso» no tempo da Roma Antiga. Trata-se apenas de concentração e podemos sair dela em qualquer altura. Há também a noção errada que perdemos o controlo e que o terapeuta nos pode levar a fazer algo que não queremos.

Voltando à ligação entre hipnose e regressão…

Se lhe disser «feche os olhos, respire profundamente, relaxe os músculos», isso é um estado leve de hipnose. Mas posso dizer «quero que se lembre do que comeu ontem». Nesse caso, iria recordar o cheiro, o sabor, a textura de forma muito mais intensa do que se o fizesse agora, que se encontra de olhos abertos e num estado normal da consciência. Depois, podia regredir ainda mais no tempo até à sua infância. Isso é usar a hipnose para regredir no tempo. Quando falamos em regressão a vidas passadas não paramos na infância: vamos até vidas passadas.

Como funciona?

Da mesma maneira que funciona a psicoterapia tradicional: a cura acontece através da lembrança da origem do trauma. A pessoa recorda-se de um evento traumático ou não, algumas vezes com emoção (catarse), e isso tem um efeito libertador. Um psicoterapeuta freudiano diz «vamos até à sua infância descobrir de onde vem o medo que tem da água» e a pessoa lembra-se do dia em que ficou presa a uma onda e o sintoma desaparece. A técnica na terapia de regressão a vidas passadas é a mesma, exceptuando que talvez na vida passada a pessoa afogou-se. Portanto, é muito semelhante à que Freud ou Jung usavam, em que as pessoas estavam deitadas num sofá, num estado leve de hipnose e depois faziam associações mentais livres.

Quais as diferenças?

Intervenho mais e a pessoa apercebe-se que viveu noutro tempo, com outro corpo, nome, mas a mesma alma. Não só o sintoma melhora, como o medo da morte se transforma. Os valores também: «Quando morri não levei a conta bancária, levei o que aprendi, a forma como tratei as pessoas».

Os cépticos podem dizer que são memórias falsas, fruto de «armadilhas do cérebro» ou da imaginação. Como se pode ter a certeza da veracidade da experiência?
Por um lado, ao nível do efeito terapêutico, o facto da vida passada ser ou não real não importa: o que importa é que o sintoma, a vida do paciente melhora, que é uma técnica terapêutica que permite eliminar fobias, perturbações psicossomáticas, tratar a depressão... Mas num segundo nível, existem provas: pessoas que falam línguas estrangeiras que nunca aprenderam; outras contam pormenores históricos que desconheciam antes da regressão. Tive pacientes que tinham memórias da II Guerra Mundial, do número e nome das chapas de identificação de soldados, depois investigaram e confirmaram esses dados. Milhares de casos foram validados.

Está estudada a sua taxa de sucesso?

Existem provas baseadas em relatos e um vasto número de terapeutas praticam-na, mas muitos jornais psiquiátricos ainda não publicam artigos científicos sobre o tema. Funciona quase como um círculo vicioso: não publicam porque dizem que não há bibliografia sobre o assunto, mas esta não existe porque não publicam e então temos de escrever livros para divulgarmos o trabalho desenvolvido. Tal como em qualquer terapia, a taxa de sucesso varia em função do problema. Nas fobias é muito elevada, mas nos casos de doença bipolar é muito mais baixa, porque está em causa uma patologia com uma componente biológica muito forte.

Em que ponto está a investigação em torno desta terapia?


Já há algumas publicações académicas que se dedicam ao tema da regressão a vidas passadas, assim como há organizações de terapeutas nesta área que estão a começar a publicar o seu trabalho e cada vez mais terapeutas que se estão a associar a estas organizações.

Psiquiatras?

Psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas de saúde mental. Alguns são mais rigorosos outros mais abertos. Existe a International Association for Regression Research & Therapies (www.iarrt.org), uma organização complexa com um departamento para profissionais e outro para não-profissionais.

Acredita que será possível um dia validar cientificamente a terapia de regressão a vidas passadas?
Depende do que entende por «científico». Não sei se alguma vez teremos um «teste de ADN» para isto, mas acredito que «científico» em termos clínicos, tal como se avaliam outras psicoterapias, sim.

E, por exemplo, a avaliação das reacções cerebrais? Nunca a realizou durante as suas sessões?

No livro The Universe In a Single Atom, o Dalai Lama fala sobre esse tipo de pesquisa aplicado aos efeitos da meditação ao nível do funcionamento cerebral, com recurso a imagem por ressonância magnética, electroencefalograma, e sobre o facto de muitas pessoas meditarem e de isso alterar as funções fisiológicas. Mas ao nível da regressão a vidas passadas é um pouco mais complicado.

Porquê?

Se durante a meditação a mente está «quieta», durante a regressão todos os sistemas – visual, auditivo, olfactivo – estão activos, o cérebro está em polvorosa. Portanto, os exames irão apenas mostrar um cérebro activo e revelar onde a actividade está a acontecer, mas isso não será suficientemente específico para se poder dizer que é uma vida passada. Se me lembrar de um piquenique que vivi aos cinco anos o tipo de actividade cerebral é idêntico.

É uma terapia segura?


É, se for realizada por um bom terapeuta que deve ser escolhido tal como seleccionamos outros especialistas (pedindo referências a pessoas que conhecemos, a outros especialistas, verificando as credenciais). O terapeuta consegue controlar o nível de emoções. A pessoa pode flutuar e visualizar de cima ou à distância, como se estivesse a assistir a um filme, ou então aproximar-se.

Em média, quantas sessões terapêuticas são necessárias?
Depende do sintoma. Se for uma simples fobia bastam uma a três sessões. Mas também depende do paciente: há pessoas que entram num estado profundo de concentração imediatamente e há outras que precisam de algumas sessões para ganhar confiança, para se libertarem do hemisfério esquerdo do cérebro, da sua necessidade de controlo.

Nota diferenças entre homens e mulheres, na forma como reagem à terapia?

Apenas uma: 75 por cento das pessoas que entram no meu consultório são mulheres. Têm uma mente mais aberta a temas como espiritualidade, estão familiarizadas com a intuição. Sabem muito mais sobre emoções, vivenciam os laços de forma intensa.

Ainda prescreve medicamentos aos seus pacientes?
Sim. Teillard de Chardin dizia que «não somos seres humanos a viver uma experiência espiritual, somos seres espirituais a viver uma experiência humana». Eu acredito nisso e, portanto, aqui estamos nós em corpos físicos que, por vezes, precisam de fármacos. Muitas depressões têm uma raiz biológica. Se a pessoa se sente tão deprimida que não consegue reagir, dormir ou concentrar-se não vai ser bem sucedida ao fazer a regressão. Mas se eu prescrever um antidepressivo, irá concentrar-se e sentir-se melhor e aí poderemos combinar a terapia da regressão e o fármaco, em doses e períodos menores. É a chamada medicina complementar. Os resultados são mais positivos.

Os estudos revelam uma relação entre a mente, o corpo e o espírito?

A pesquisa demonstra uma forte ligação entre a mente e o corpo. É a chamada mind-body connection ou psiconeuroimunologia. Sabemos que, por exemplo, o medo, o stress e a ansiedade conseguem deprimir as funções do sistema imunitário, assim como o facto de nos libertarmos deles o ajuda a combater doenças como o cancro ou infecções. O espírito é a ligação ao imortal. Pessoas que meditam, praticam ioga podem lá chegar, assim como através da oração, da contemplação, até do amor. A parte espiritual é um estado de compaixão que se aplica a toda a humanidade, não implica necessariamente uma relação pessoal.

Refere-se à noção de se pertencer a algo maior do que nós?

Sem dúvida. Acredito que existe uma energia que une todas as pessoas, animais, plantas. É uma energia comum e todos somos compostos por ela.

António Damásio, neurocientista, diz que «a emoção e os sentimentos constituem a base daquilo que os seres humanos têm descrito, desde há milénios, como alma ou espírito humano». Concorda?

Essa afirmação pode ser interpretada de várias formas. No livro, «O dia em que a minha vida mudou», a neurocientista Jill Bolte Taylor descreve o episódio em que teve um AVC no hemisfério esquerdo do cérebro (a área das associações de palavras). Estava a viver uma experiência espiritual fantástica enquanto não conseguia comunicar. Ela refere-se ao hemisfério direito como a sede da intuição, da criatividade e das emoções e penso que o que acontece, à maioria de nós, é que o funcionamento do hemisfério esquerdo bloqueia algumas funções do hemisfério direito. É através deste que comunicamos com a intuição, com o nosso lado espiritual, com a alma.

Como a descreve?

É a parte imortal do ser. A nossa consciência continua. Se reside no cérebro ou não isso não interessa, mas penso que essa ligação é feita através do hemisfério direito, tal como Jill Bolte Taylor descreve. Duvido que as emoções sejam o mesmo que a alma. A alma é um estado de amor incondicional…

E, assim sendo, as emoções seriam as manifestações da alma operadas pelo cérebro?

Apenas se se exprimem através de bondade, compaixão. Se estivermos a falar de raiva ou medo não estamos a falar de alma, mas de obstruções à alma. Quando nos conseguimos libertar das emoções negativas, debaixo delas encontra-se a alma. É um estado que está para além das emoções, é muito maior do que elas.

Texto: Nazaré Tocha com Brian Weiss (psiquiatra)
Foto: Artur

A responsabilidade editorial desta informação é da revista
SaberViver (Portugal)

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