A nova realidade econômica do Brasil fez com que o país voltasse a ser um lugar atrativo para os estrangeiros morarem e fazerem investimentos, o que levou a um forte crescimento de pessoas com a situação regularizada. Mas se essa nova onda de imigração não assusta o governo brasileiro, ela traz seus riscos e tem suas limitações.
Entre 2010 e 2011, segundo o governo, o contingente de imigrantes vivendo em situação regular no país cresceu em mais de 500 mil, saltando de 961 mil para 1,46 milhão em julho do ano passado.
Uma pequena parte desses imigrantes, cerca de 45 mil, foram anistiados pelo Ministério da Justiça em 2009 e ganharam a autorização de permanência temporária. Desses, 18 mil já requereram a autorização para permanência definitiva no país.
E a expectativa da diretora do Departamento de Estrangeiros da Secretaria Nacional de Justiça, Izaura Miranda, é que todos peçam para fixar residência no Brasil.
"(A regularização) é uma vantagem para o governo. Os irregulares não pagam INSS e oneram o SUS. O irregular não paga nenhum imposto, não pode trabalhar, mas sabemos que trabalham", disse Izaura à Reuters.
A maior parte desses anistiados é formada por jovens entre 19 e 30 anos (44 por cento) e do sexo masculino (61 por cento). E a maioria é proveniente da Bolívia, da China e do Paraguai.
MERCADO DE TRABALHO
"Há 15 anos, o eldorado para os brasileiros eram os Estados Unidos. Hoje o eldorado para o boliviano é o Brasil", comparou Izaura.
Para ela, o interesse dos estrangeiros no país deve crescer ainda mais nos próximos anos por conta da estabilidade econômica e das oportunidades de trabalho que continuarão surgindo.
As duas principais centrais sindicais brasileiras -CUT e Força Sindical- concordam que o melhor a fazer é regularizar a situação desses imigrantes até para protegê-los de práticas abusivas no mercado de trabalho.
Mas o presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), questiona sobre o risco de os brasileiros perderem espaço no mercado de trabalho nos postos que exigem maior qualificação.
"Esse pessoal está vindo para ficar com os melhores empregos. Esse é o problema", argumenta o sindicalista, que não vê problemas com o atual contingente de estrangeiros, mas prevê problemas no futuro, caso o Brasil não mantenha sua trajetória de crescimento.
O Ministério do Trabalho emitiu até setembro de 2011 mais de 52,5 mil autorizações de trabalho, contra pouco mais de 39 mil emitidas no mesmo período de 2010
Já a diretora do Departamento de Estrangeiros disse que esse movimento migratório não preocupa o governo e também não deveria preocupar os brasileiros, nem a longo prazo.
"Num universo de 198 milhões de habitantes temos (só) quase 1,5 milhão de estrangeiros regulares", argumentou Izaura, lembrando que o Brasil já precisou dos imigrantes em vários momentos da sua história para se desenvolver.
Para a diretora, esse novo fluxo migratório poderá se reverter no futuro e o próprio Brasil serve de exemplo.
"Há 15 anos tínhamos 4 milhões de brasileiros lá fora. Hoje esse número não chega a 2 milhões. Por quê? Porque instalou-se a estabilidade econômica e os brasileiros estão voltando. Retornando a estabilidade econômica lá fora nada impede que esses estrangeiros voltem para seus países", argumentou.
LEGISLAÇÃO
Ter a situação regularizada no Brasil é uma tarefa mais fácil do que na Europa ou nos Estados Unidos, segundo a diretora, e um dos argumentos é que o Estatuto do Estrangeiro, que rege a regularização dos imigrantes é de 1982.
Com uma legislação tão antiquada, as permissões de permanência no país têm sido regidas muitas vezes por resoluções do Conselho Nacional de Imigração.
"É claro que nas lacunas dessa lei (do Estatuto do Estrangeiro) nós trabalhamos com resoluções no Conselho. Já estamos com quase 100 resoluções. Para concessão (do visto) aos haitianos foi necessária uma resolução do conselho", exemplificou Izaura.
No começo do mês, o Brasil concedeu vistos de permanência provisória para aproximadamente 4 mil haitianos que entraram ilegalmente no país. Além disso, para evitar a imigração ilegal, a embaixada brasileira em Porto Príncipe emitirá até cem vistos por mês a haitianos que queiram vir ao Brasil. A concessão vale por cinco anos.
Aliás, essa limitação tem provocado inquietações entre os defensores dos direitos humanos.
"Estamos preocupados com o funcionamento efetivo do 'visto humanitário' e também com a situação daqueles que têm sua entrada negada no Brasil. Há relatos de famílias desabrigadas em zonas de fronteira, confrontadas pela Polícia Federal e sem ter como nem para onde regressar. Isso não é condizente com uma política que se autodenomina humanitária", disse Juana Kweitel, diretora da ONG Conectas.
A entidade, que tem status consultivo desde 2006 junto à Organização das Nações Unidas (ONU), enviou nesta terça uma carta a vários ministros do governo pedindo o detalhamento da medida, questionando como ela está sendo divulgada entre a população haitiana e que tipo de documentos serão exigidos para concessão do visto.
Fonte: Ag Reuters